Quase 10 mil animais já foram resgatados no Rio Grande do Sul desde o início das enchentes, que vitimaram 107 pessoas. Dois episódios, em especial, envolvendo o cavalo Caramelo e outro que quase se afogou, emocionaram o país. A mobilização da população e de forças de segurança para salvar os equinos sintetiza a relação histórica do cavalo com o povo gaúcho, marcada pela paixão e pelo companheirismo.
Uma das mais emblemáticas imagens da tragédia que assola o estado foi o cavalo Caramelo, que ficou entre a vida e a morte, por centímetros, sobre o telhado de uma casa em Canoas. Após quase 100 horas, foi salvo em uma força-tarefa. Em outro caso marcante, o vice-prefeito de Santo Antônio da Patrulha desafiou a natureza para salvar um animal das águas turvas.
Para alívio do Rio Grande do Sul e do Brasil, Caramelo e outras dezenas de cavalos foram salvos e estão em recuperação. Eles se tornam um símbolo poderoso da resistência e bravura do gaúcho em meio às tragédias das chuvas.
“O cavalo teve um papel central em ocupação na formação do estado somado aos muitos anos de companheirismo nas guerras, no trabalho e no lazer. O cavalo também representa, além da força do gaúcho, uma paixão para as pessoas que lidam com ele”, relata Edilson Villagran, poeta e escritor.
O cavalo crioulo é animal-símbolo do Rio Grande do Sul e considerado patrimônio cultural desde 2002, assim como o quero-quero, ave de médio a pequeno porte. A relação com o animal é uma tradição que faz parte do DNA do povo gaúcho.
“Foi do lombo do cavalo, por exemplo, que os farrapos, em 1835 a 1845, puderam trilhar o RS resistindo a duros embates, não só contra as forças imperiais melhores preparadas para a luta, mas também contra as duras privações resistindo a todos os revezes para deixar seu nome na história”, acrescenta Villagran.
Para o poeta, “o cavalo passou a ser figura central nas atividades relacionados às artes, poesia, escultura, transporte, lazer e esporte. Portanto, esse animal tem importância tanto socio-cultural quanto econômica”.
Nico Fagundes, cantor e compositor tradicionalista, escreveu um verso retratando a importância do animal: “de a cavalo lá na Serra, eu tô mais perto de Deus, até os pássaros são meus”. A poesia sinaliza que o homem, quando está sobre o cavalo, fica mais alto e mais próximo dos céus.
“Falar de um gaúcho a cavalo é falar da imagem do nosso estado. Sempre lembro do tio Nico quando escreveu o verso dos Cavaleiros da Paz: ‘são esses homens e seus cavalos, lá vão os galos, são os centauros, vivem assim’. O gaúcho e o cavalo têm uma relação de história, de amor e de vida”, declarou o tradicionalista Neto Fagundes.
Neto Fagundes é filho de Bagre Fagundes e sobrinho de Nico Fagundes, compositores de “Canto Alegretense”, canção em homenagem ao município de Alegrete. A música foi tocada pela primeira vez no programa Galpão Crioulo, da RBS TV.
Por Bruno Ravazzolli, Eduardo Paganella, g1 RS e RBS TV.