Fábio Gelape Faleiro (Pesquisador e chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Cerrados)
Breno Lobato (Jornalista da Embrapa Cerrados)
A fruticultura tem grande importância para o Brasil nos aspectos econômicos, sociais e ambientais. O País é o terceiro maior produtor mundial de frutas, com produção anual de mais de 50 milhões de toneladas em aproximadamente 2,4 milhões de hectares, empregando mais de 5 milhões de brasileiros, o que representa cerca de 16% dos postos de trabalho no agronegócio nacional, de acordo com a Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas). O segmento da fruticultura ainda tem um grande potencial de crescimento, considerando a possibilidade de aumento da demanda do mercado interno e das exportações, que vêm crescendo nos últimos anos.
Ao associar a diversidade de clima e solos nos diferentes biomas com ciência e tecnologia, o Brasil é capaz de produzir uma ampla gama de frutas tropicais, subtropicais e temperadas em todas as regiões ao longo de todo o ano, gerando empregos em diferentes elos da cadeia produtiva e contribuindo para a segurança alimentar do País, com a oferta de frutas ricas em vitaminas e minerais, nutrientes essenciais à saúde. Do ponto de vista ambiental, a fruticultura também contribui para a preservação do ambiente, essencialmente em sistemas agroflorestais, mas também como diferentes opções de espécies de frutas nativas para a recomposição de áreas de reserva legal.
A fruticultura irrigada é um importante vetor de desenvolvimento regional e inclusão socioprodutiva porque pode ser realizada em todo o Brasil, incluindo regiões com menor desenvolvimento econômico e menor ocorrência e distribuição de chuvas ao longo do ano. Essa possibilidade permite a inclusão de comunidades rurais na economia por meio do emprego de qualidade e do empreendedorismo nas diferentes etapas da cadeia produtiva. Enquanto a inclusão socioprodutiva favorece pequenos e médios produtores, associações, cooperativas e organizações, incluindo os setores relacionados à agricultura familiar, a fruticultura permite a agregação de valor por meio do beneficiamento de frutas em diferentes produtos agroindustriais, gerando mais oportunidades de trabalho e renda tanto no campo como na cidade.
A produção econômica na pequena e na média propriedade é viabilizada pela fruticultura irrigada, o que contribui de forma decisiva para a melhoria da qualidade de vida no campo. Em regiões onde há dependência de monoculturas ou da pecuária, a fruticultura é uma alternativa importante para a diversificação da produção e o fortalecimento da economia local, diminuindo assim a vulnerabilidade econômica. A fruticultura irrigada permite, ainda, a introdução de novos cultivos para diversificar a produção e diminuir riscos climáticos e de mercado. Quando bem planejada, a fruticultura pode ser uma atividade sustentável, ou seja, economicamente viável, socialmente justa e ambientalmente correta e responsável.
Mas para que a fruticultura promova de fato o desenvolvimento regional sustentável, são necessários três pilares: ciência, tecnologia e inovação; transferência de tecnologia (TT), assistência técnica e extensão rural; e políticas públicas que resolvam problemas específicos de cada região ou comunidade, que podem ser de logística ou de acesso a crédito e a mercados internos e externos, por exemplo.
A Embrapa, em conjunto com as empresas estaduais de pesquisa, universidades e o setor produtivo, tem contribuído com soluções tecnológicas para promover a fruticultura irrigada em diferentes regiões do País. As tecnologias desenvolvidas estão relacionadas aos programas de melhoramento genético de frutíferas, com a geração e disponibilização de cultivares geneticamente superiores e a concepção de sistemas de produção mais eficientes, que adotam boas práticas agrícolas relacionadas à produção de material propagativo, o controle fitossanitário baseado no manejo integrado de pragas, além da nutrição equilibrada das plantas e do manejo responsável da irrigação e dos recursos hídricos.
O segundo pilar (TT) tem sido trabalhado pelas empresas estaduais de assistência técnica e extensão rural (ATERs), pelo Sistema Senar e pelo setor produtivo por meio de empresas de consultoria e dos departamentos técnicos de associações e cooperativas de produtores. O terceiro pilar (políticas públicas) depende das secretarias municipais e estaduais de agricultura, bem como de gestores públicos municipais, estaduais e federais. O sucesso do desenvolvimento regional depende, portanto, desses três pilares.
Existem exemplos importantes do sucesso da fruticultura irrigada no desenvolvimento regional no Brasil. Um dos mais conhecidos e produtivos é o polo de fruticultura irrigada e agroindustrial do Vale do São Francisco, na região de Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), que transformou essa porção do semiárido nordestino numa das mais maiores produtoras e exportadoras de frutas frescas, especialmente de manga e uva. Outro exemplo é o Projeto Jaíba, localizado no Norte de Minas Gerais e que abrange principalmente pequenos e médios produtores, promovendo a inclusão produtiva de muitas propriedades rurais, incluindo aquelas ligadas à agricultura familiar.
Experiência mais recente é o Polo Agroindustrial e Bioenergético do Médio São Francisco, região que desponta com grande potencial produtivo na fronteira agrícola do Matopiba, que tem o município de Barra (BA) como centro da produção local. A região é composta pelos biomas Cerrado e Caatinga, com alta disponibilidade hídrica (por ali passam os rios Grande e São Francisco), grande quantidade de terra agricultável, clima favorável e localização privilegiada para logística e escoamento da produção. Para impulsionar a fruticultura irrigada na região, o Sindicato dos Produtores Rurais de Barra (SindBarra) e parceiros organizaram, em outubro deste ano, o I Seminário de Fruticultura Irrigada e lançaram para outubro 2025 a Feira Barra Agro Show.
Com base nas experiências de sucesso e nos pilares do desenvolvimento regional baseado na fruticultura irrigada, a Embrapa Cerrados (DF) e parceiros têm desenvolvido projetos nessa perspectiva. Um exemplo é o “Programa Frente: Programa de Inovação de Suporte à Rota da Fruticultura da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno”. O programa faz parte da Rota das Frutas RIDE-DF, que tem como objetivos aumentar a produção e o fornecimento de frutas para o mercado interno e externo; gerar emprego e renda na região do DF e Entorno; diversificar e implantar novas culturas com ações de pesquisa, capacitação, logística e mercado; fomentar e motivar novos agricultores na produção de frutas.
Outro exemplo é o projeto “Desenvolvimento e implementação de ferramentas para manejo de irrigação e monitoramento do impacto socioeconômico das ações de fornecimento de sistemas de irrigação pela Codevasf a agricultores localizados no Polo de Irrigação do Planalto Central de Goiás”. O projeto faz parte da política pública Fruticultura Irrigada no Vão do Paranã, Nordeste de Goiás, é liderado pela Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Goiás e conta com a parceria da Embrapa Cerrados, da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), da Emater Goiás e do Senar. A iniciativa busca viabilizar a produção irrigada de frutas como manga e maracujá por 2.500 famílias de agricultores assentados de reforma agrária em Flores de Goiás, Formosa e São João d’ Aliança, municípios abastecidos pelas barragens do Rio Paranã e do Ribeirão Porteira.
No Brasil, segundo dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), existem cerca de 7 milhões de imóveis rurais e a triste estimativa de que em 80% dessas propriedades o produtor não tem uma fonte de renda estável e suficiente para viver com qualidade de vida no campo. Promover o desenvolvimento regional, a inclusão socioprodutiva e a melhoria da qualidade de vida no campo é, portanto, um grande desafio nacional. Para isso, a fruticultura irrigada é uma importante alternativa, com diversos exemplos de sucesso em praticamente todas as regiões do País. Vale destacar que essas experiências exitosas contam, invariavelmente, com ações de pesquisa, desenvolvimento, transferência de tecnologia e inovação para melhorar a eficiência, a produtividade e a competitividade da fruticultura para a produção de frutas de alta qualidade em períodos de entressafra, possibilitando o acesso a mercados nacionais e internacionais.
A geração de emprego e renda com a incorporação da mão de obra local em diferentes etapas da cadeia produtiva e a inclusão de pequenos e médios produtores é um aspecto social de grande relevância. Políticas públicas para acesso a crédito, apoio à comercialização, desenvolvimento de infraestrutura de irrigação e acesso a recursos hídricos, além de logística de transporte para escoar a produção podem ter grande importância, conforme as características de cada região. Os projetos de desenvolvimento regional com base na fruticultura irrigada devem considerar as particularidades regionais com relação a disponibilidade hídrica, solos e clima, além da vocação e das potencialidades para a fruticultura e do adequado planejamento para garantir a sustentabilidade econômica, social e ambiental da atividade.
As experiências de sucesso, o potencial de aumento da demanda dos mercados interno e externo, a disponibilidade de tecnologias para produção de diversas frutas em diferentes regiões brasileiras e a força do produtor rural brasileiro comprovam que a fruticultura irrigada é de fato um importante vetor de desenvolvimento regional e inclusão socioprodutiva e deve continuar a ser objeto de políticas e projetos que impulsionem o crescimento agrícola sustentável do País.