Em meio a críticas, denúncias e questionamentos jurídicos, o prefeito de Paraíso do Tocantins, Celso Morais (MDB), decidiu revogar a doação de três extensas áreas públicas, totalizando mais de 700 mil metros quadrados, à empresa Ambientallix Ambiental Ltda. A medida foi formalizada pelo Decreto nº 1.338/2025, publicado em junho, e é diretamente influenciada pela Ação Popular nº 0004477-57.2024.8.27.2731, que tramita na 1ª Vara dos Feitos das Fazendas e Registros Públicos da Comarca de Paraíso.
A ação judicial, iniciada por cidadãos, questiona a legalidade do processo de doação, autorizado pelas Leis Municipais nº 2.206/2022 e 2.230/2022. Os autores da ação alegam que os imóveis foram repassados à empresa sem o devido processo licitatório ou concorrência pública, em desrespeito a normas legais e princípios constitucionais da administração.

DOAÇÃO SEM LICITAÇÃO E DESCUMPRIMENTO DE ENCARGOS
O caso remonta a 2022, quando a gestão municipal encaminhou à Câmara Municipal os projetos de lei que autorizaram a doação dos terrenos à Ambientallix. O objetivo declarado era a “implantação e operação de Aterro Sanitário de Resíduos Sólidos Urbanos”, conforme o art. 1º da Lei Municipal nº 2.206/2022. No entanto, a ausência de licitação para a cessão das áreas é um dos pontos centrais da Ação Popular, apontada como violação à Lei nº 8.666/1993 e aos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade administrativa.
A Lei Municipal nº 2.206/2022 previa uma série de encargos e condições para a Ambientallix, sob pena de revogação. Segundo o art. 5º da mesma lei, “o não cumprimento das disposições constantes nesta lei implicará na revogação de pleno direito da doação, independentemente de qualquer notificação e ressarcimento por parte do Município”.
Entre as obrigações estava o início das atividades de instalação do aterro sanitário em seis meses (Art. 6º, inciso IV) e a apresentação de estudo ambiental e protocolo de licenças em 90 dias (Art. 8º, inciso VII) após a doação, ocorrida em agosto de 2022.
Segundo o Poder Executivo, a revogação agora – quase três anos depois – se deu justamente pelo descumprimento dessas obrigações. O município apontou a não apresentação do estudo ambiental, do projeto técnico detalhado, a falta de obtenção das licenças junto ao órgão ambiental competente e o não início da implantação da estrutura mínima necessária.
A reversão foi primeiramente declarada por meio de uma Declaração Administrativa de Reversão, em 12 de maio de 2025, e consolidada no Decreto nº 1.338/2025, de 25 de junho, que em seu Art. 1º determina “a reversão da doação dos seguintes imóveis públicos anteriormente destinados à empresa AMBIENTALLIX AMBIENTAL LTDA, por descumprimento das condições estabelecidas no ato de doação”.

LIXÃO A CÉU ABERTO E EMERGÊNCIA NA SAÚDE PÚBLICA
Apesar da doação ter sido justificada pela necessidade de um aterro sanitário, o município de Paraíso do Tocantins continua utilizando um lixão a céu aberto para a destinação dos resíduos sólidos urbanos. Essa prática, que contraria a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) — a qual previa o encerramento dos lixões até 2014, com prorrogação até agosto de 2024 —, tem gerado graves impactos ambientais e de saúde pública.
A gravidade da situação foi reconhecida oficialmente pelo município em maio de 2024, quando o Decreto n.° 932/2024 declarou “situação de Emergência em Saúde Pública na execução do serviço de destinação final dos Resíduos Sólidos Urbanos” no município.
A medida justificou a necessidade de contratações emergenciais, citando riscos de epidemias, danos à saúde e ao meio ambiente devido ao acúmulo de lixo. Na época, documentos da Secretaria de Meio Ambiente, de maio de 2024, também reforçaram a urgência e a impossibilidade de processo licitatório regular para resolver o problema, diante do iminente risco à saúde.
PROCESSO JUDICIAL SEGUE EM FRENTE
Mesmo com a revogação administrativa já realizada pela Prefeitura, a Ação Popular prossegue em tramitação. A ação requer, entre outros pontos, a declaração de nulidade das leis municipais que autorizaram a doação, o reconhecimento de possível lesão ao patrimônio público e perdas e danos ao meio ambiente, além da análise judicial da legalidade de todos os atos administrativos envolvidos na cessão dos terrenos.
A Ambientallix, em manifestação no processo, apresentou um projeto técnico para um aterro sanitário com vida útil de 30 anos e capacidade para atender 20 mil habitantes, mencionando a intenção de parcerias com municípios vizinhos. No entanto, informou que nenhum contrato havia sido firmado.
A expectativa é de que o Ministério Público do Tocantins se manifeste em breve no processo, podendo se posicionar sobre a necessidade de responsabilização de agentes públicos envolvidos nesta controversa doação.
Por AF Notícias.