Na manhã da última sexta-feira (23), foi realizado o tradicional Dia de Campo sobre Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), na Unidade de Referência Tecnológica implantada pela Embrapa em sua área demonstrativa, dentro do Parque Tecnológico Ivaldo Cenci. O evento integrou a programação da Agrobrasília 2025, feira realizada entre os dias 20 e 24 de maio, que neste ano bateu recorde de público: cerca de 188 mil visitantes passaram pelo evento ao longo dos cinco dias. O Dia de Campo foi promovido pela Embrapa, Rede ILPF e Coopa-DF.
“Essa é mais uma ação de transferência de tecnologia realizada em parceria”, destacou o chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Cerrados, Fábio Faleiro. “Trata-se de um evento já consolidado, voltado a demonstrar o potencial da agricultura tropical brasileira. Na Embrapa Cerrados, mantemos uma unidade demonstrativa que atrai visitantes do Brasil e do mundo, permitindo mostrar que nossa agricultura não se baseia no desmatamento, mas sim em ciência, inovação e tecnologia. Temos uma agricultura forte, produtiva e ambientalmente comprometida”, reforçou.
Durante a abertura do evento, Sebastião Pedro, chefe-geral da Embrapa Cerrados, destacou o crescimento contínuo do sistema ILPF no país. “A cada ano, esse sistema avança em área e resultados, oferecendo ao produtor a oportunidade de testar, diretamente em sua propriedade, tecnologias sustentáveis desenvolvidas pela Embrapa. Nosso clima tropical é um aliado valioso, permitindo mais de uma safra ao ano, desde que saibamos gerir bem o tempo e adaptar as culturas. É um sistema que vem sendo aprimorado com frequência e que se destaca por sua sustentabilidade em todos os aspectos”, afirmou.
Uma das tecnologias apresentadas durante o Dia de Campo foi o Sistema Antecipe, voltado ao cultivo antecipado do milho. A inovação foi detalhada pelo pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo, Décio Karam, como uma solução estratégica para viabilizar a segunda safra na região do Planalto Central. O sistema consiste na semeadura intercalar do milho entre as linhas da soja antes da colheita da oleaginosa, permitindo antecipar em até 20 dias o estabelecimento da cultura do milho e reduzindo os riscos provocados por adversidades climáticas no final do verão.
“A demanda por uma janela de plantio maior foi o ponto de partida para desenvolvermos essa solução. O objetivo principal sempre foi reduzir o risco climático — o aumento da produtividade veio como consequência”, explicou Karam. Segundo ele, a técnica permite o cultivo intercalar do milho mesmo com cultivares de soja de ciclo mais longo, além de ampliar o plantio do cereal para áreas antes limitadas pelo Zoneamento de Risco Climático (Zarc).
Karam compartilhou os desafios enfrentados no desenvolvimento da tecnologia, como a criação de máquinas específicas para garantir a semeadura sem danificar a soja. Também apresentou exemplos práticos de propriedades que já adotaram o Sistema Antecipe, com resultados expressivos.
“Posso apresentar dados de norte a sul do país, de Boa Vista a Pelotas. A média que temos alcançado é de 1,5 a 2 sacas por hectare a mais por dia de antecipação. Hoje, já temos comprovação da eficiência do sistema, tanto com sorgo quanto com milho, integrados com braquiária e panicum”, afirmou. “Minha missão agora é convencer o produtor de que funciona. Eu acredito na tecnologia porque vi os resultados na prática”, concluiu.
Outro destaque do evento foi a participação do presidente-executivo da Rede ILPF, Francisco Maturro, que apresentou um panorama sobre o uso e a ocupação das terras no Brasil e o histórico de implementação da ILPF no país. “Se o plantio direto foi a segunda revolução do agro e possibilitou a segunda safra, os sistemas integrados são a terceira revolução. E temos um potencial de crescimento muito maior do que o restante do mundo”, destacou.
Segundo Maturro, dados de 2022 registram que o Brasil conta com 17,43 milhões de hectares sob sistemas ILPF, especialmente na combinação entre lavoura e pecuária. “Sabemos, no entanto, que esse número é ainda maior hoje. Mas é um levantamento complexo, feito por satélite, que exige que o algoritmo seja calibrado para reconhecer corretamente o ciclo completo das culturas. Leva tempo”, explicou.
Ele também apresentou casos de sucesso, como a Fazenda Santa Brígida, em Ipameri (GO), que há quase 20 anos adotou o sistema ILPF e hoje é referência. “Eles conseguiram elevar o teor de matéria orgânica no solo de 1,8% para 3,6%. Isso levaria 150 anos para acontecer naturalmente, e isso se o solo não se degradasse antes”, exemplificou.
Maturro enfatizou a importância da difusão dos sistemas integrados. “Nosso papel na Rede ILPF é ampliar o alcance dessa tecnologia. Costumo dizer que conseguimos impulsionar até 25% da adoção, o resto é por inveja — o produtor vê o vizinho prosperar e quer fazer igual”, brincou. Ele compartilhou o caso de um produtor no Pará que já implantou ILPF em 810 hectares. “Quando perguntei sobre os resultados, ele respondeu: agora, tomei gosto pela agricultura”, relatou.
A experiência da Fazenda Santa Bárbara, em Alexânia (GO), com a implantação da tecnologia de integração também foi apresentada no Dia de Campo pelas irmãs Camila Caixeta e Isabela Caixeta. A propriedade foi adquirida pela família em 2009. A implantação da integração ocorreu anos mais tarde, em 2020, com o primeiro plantio de milho consorciado com a braquiária. “Fizemos um teste e deu certo. Foi muito gratificante ver aquele capim todo pronto para receber o gado, no momento da colheita do milho”, relembrou Camila.
A integração foi implantada em 395 dos 1.500 hectares da fazenda, com resultados econômicos bastante animadores. “Comparando uma área sem ILPF com outra que utiliza o sistema, o retorno praticamente dobrou. Na safra 2022/2023, a taxa interna de retorno (TIR) para uma lavoura de soja seguida de milho safrinha era de 24%. Na área com integração, esse índice chegou a quase o dobro, graças à inserção do gado no sistema. Sabemos que os resultados podem variar, mas a ILPF é uma estratégia eficaz para mitigar riscos”, avaliou.
Saiba o que é a Rede ILPF
Trata-se de uma parceria público-privada formada pela Embrapa, a cooperativa Cocamar, e as empresas Bradesco, John Deere, Minerva Foods, Soesp, Suzano, Syngenta e Timac Agro. Criada em 2012, tem como objetivo intensificar a sustentabilidade da agropecuária brasileira, por meio da adoção das tecnologias de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
Por Juliana Caldas/Embrapa Cerrados.