Não é novidade o problema crônico enfrentado pelo Brasil quanto à regularização fundiária. Órgãos como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e, no âmbito estadual, o Instituto de Terras do Tocantins (Itertins) acumulam milhares de processos sem o devido andamento, reflexo direto da insuficiência de pessoal, excesso de burocracia, limitada capacitação técnica e ausência de políticas públicas eficazes.
Considerando a grande extensão territorial e a baixa densidade demográfica, o país é terreno fértil para estimular a grilagem, ocupações ilegais e sobreposição de títulos fraudulentos. Nesse contexto, o Estado do Tocantins, mais jovem da Federação e fruto da divisão do Estado de Goiás, tornou o cenário ainda mais propício para esse tipo de demanda, especialmente porque enfrenta até hoje dificuldades na correta definição e delimitação das áreas públicas e privadas, envolvendo desde títulos históricos, como os paroquiais, até concessões recentes emitidas pelo próprio Estado.
Esse panorama ganha destaque quando o Poder Judiciário tocantinense recebe ações para definir e demarcar os limites de determinadas áreas, as chamadas ações discriminatórias e demarcatórias, procedimentos judiciais que esbarram na morosidade causada pelo expressivo volume processual a cargo de poucos magistrados, somada à complexidade técnica e jurídica das matérias envolvidas — pois abrangem um emaranhado de documentos, como mapas, cartas e plantas topográficas, além de certidões e títulos, dos mais recentes aos mais antigos. A multidisciplinaridade é muitas vezes necessária para estabelecer a origem e o estado atual dos imóveis, sendo acionados profissionais especializados em geoprocessamento, topografia e engenharia para solucionar controvérsias.
Diante disso, a atuação do advogado especializado torna-se fundamental. Com o advento do atual Código de Processo Civil, surgiram mecanismos importantes que buscam maior celeridade e eficiência processual na regularização fundiária. Procedimentos como a usucapião extrajudicial e a adjudicação compulsória possibilitam aos possuidores de boa-fé regularizar suas propriedades diretamente nos cartórios.
No entanto, para plena eficácia desses instrumentos jurídicos, é necessário conhecimento técnico, além de uma boa relação com os cartórios, que ainda engatinham nessas novas modalidades.
A titulação de um imóvel vai muito além da formalidade, quando está devidamente registrado o bem tem maior liquidez e valorização econômica. Além disso, no caso de propriedades rurais, a regularização permite a sua utilização como garantia para financiamentos e custeios, viabilizando investimentos e o desenvolvimento da atividade produtiva.
Portanto, a regularização fundiária constitui um processo multifacetado que demanda colaboração entre órgãos públicos, profissionais especializados e as partes diretamente interessadas, visando à valorização patrimonial e à superação de desafios históricos que contribuem para o desenvolvimento econômico e social do país.
Dr. Marcel Chaves Alvim é advogado associado da Fraz Advocacia desde 2022. Especialista em Direito Agrário e Agronegócio pela FMP/RS, com experiência na atuação preventiva e contenciosa, principalmente em questões complexas no âmbito do Direito Civil. Concluinte da 58ª turma de Treinamento em Competências Interpessoais da Dale Carnegie Course.