Nas últimas semanas, foi possível testemunhar uma série de atritos criados pelo Executivo com a bancada do Agro no Congresso, ampliando um afastamento que atrapalha a boa condução dos trabalhos em prol do crescimento do setor. Houve, por exemplo, apresentação sucessiva de medidas provisórias desfavoráveis, tais como a da importação de arroz e a “MP do fim do mundo”. Esta foi assim apelidada pois limitava a dedução de créditos de PIS/COFINS para empresas e basicamente onerava o setor por decisão unilateral, sem ao menos respeitar a elementar regra tributária da anterioridade. Essa parte do texto acabou devolvida ao Executivo, numa reação que contou com o apoio da FPA.
Já os desdobramentos da importação de arroz vem sendo acompanhados de perto por este Portal, desde as primeiras críticas até a anulação do leilão que levantou dúvidas quanto a possíveis irregularidades. Com o pretexto de evitar um possível desabastecimento após as enchentes no Rio Grande do Sul, principal produtor, o governo organizou um pregão que gerou contestações judiciais, sobressalto de ânimos e gastos públicos, em meio à tragédia gaúcha. Tudo isso por dar as costas ao fato de que boa parte da colheita já tinha sido feita antes das chuvas e o desabastecimento não representava um risco real.
Por fim, o MST foi convidado a participar dos debates para o novo Plano Safra 2024/2025, justamente num momento em que as tensões agrárias se avolumam, já que os congressistas aprovaram projetos que punem com mais rigor as invasões de terras. Além de coibir a violência no campo, a bancada agrícola desempenhou papel determinante em outras vitórias como a derrubada de vetos presidenciais relativos ao marco temporal para demarcação de terras indígenas e uso de defensivos.
Sem concessões, cenário dificilmente irá melhorar
Para analistas políticos, o Executivo vem tensionando o clima quando deveria buscar pautas de interesse comum. Com efeito, parlamentares que integram frentes em defesa da agropecuária atuam de forma coesa e homogênea, ganhando disputas e impondo derrotas duras para um governo que não vem aceitando negociar. Nesse sentido, a falta de emissários se faz notar, já que o Ministro Carlos Fávaro, outrora com bom trânsito no Congresso, não consegue articular uma trégua. Mais recentemente, Neri Geller, que havia sido escalado como interlocutor com a FPA, foi demitido do cargo de Secretário de Política Agrícola, num dos desdobramentos do leilão de arroz.
Cabe lembrar que, por ocasião da posse da nova gestão federal, no início de 2023, deputados e senadores ligados ao agronegócio já alertavam sobre o tom hostil e polarizante de certas falas sobre os produtores rurais, mas se mostravam dispostos a dialogar para o bem do setor. Era essa também a postura das principais entidades do ramo, para que a página das eleições de 2022 pudesse ser finalmente virada.
O volume das safras ajudou, com colheitas recordes e novos acordos comerciais. Aos poucos, no entanto, a aparente cordialidade cessou e não houve mais acenos por parte do governo com pautas propositivas. O convite feito ao MST para participar da elaboração do novo Plano Safra foi, para muitos, a gota d’água. Atualmente, até nomes de proa da defesa agrícola, com histórico de moderação, já não veem sinais de que as conversas possam ser retomadas. Entre eles, destacam-se a senadora e ex-ministra da agricultura Tereza Cristina (PP – MS) e o presidente da CNA, João Martins.
A longo prazo, esse enfrentamento é ainda mais infrutífero para a atual gestão, uma vez que pautas importantes para o futuro agrícola brasileiro tramitam nas casas legislativas, tais como mercado de carbono. Seria uma vitória de todos caso o governo contribuísse para abrandar os ânimos e trabalhasse junto ao setor num momento crucial, com alta nos preços de diversas commodities e pressão de outros países concorrentes num ano em que o Brasil preside o G20 e irá sediar a COP 30 em 2025.
Por CNA.