Por José Florentino — São Paulo
A estiagem no Centro-Norte provocou um leve aumento de oferta de gado no mercado brasileiro no fim de 2023. Sem alternativa, muitos pecuaristas que não tinham pastagens em boas condições acabaram vendendo animais. No entanto, agora, a chegada das chuvas deve aliviar a pressão e ter o efeito contrário sobre a disponibilidade de animais para abate nos frigoríficos no curto prazo: o pecuarista que conseguiu segurar o gado deve esperar um pouco mais antes de entregá-los à indústria.
“Quem se programou e conseguiu segurar o boi com suplementação vai esperar mais tempo para ganhar peso e acabamento. Mas ainda tem gente sofrendo em Mato Grosso, porque começou a chover agora”, conta o diretor executivo do Grupo Pecuária Brasil (GPB), Luiz Roberto Zillo, em entrevista ao Valor.
Na região de Cáceres, em Mato Grosso, onde Zillo tinha uma fazenda até poucos anos atrás, choveu cerca de 1 mil milímetros em 2023, bem abaixo do que é comum, entre 1,3 mil e 1,6 mil milímetros. “No período de transição entre o que chamamos de períodos de seca e águas, em setembro, vários produtores registraram 20 a 30 milímetros, e mal distribuídos”, afirma.
Segundo ele, áreas mais férteis do Centro-Norte devem ter pastos adequados daqui a 15 ou 20 dias, o que deve atrasar a chegada de bois em 30 a 40 dias.
A região mencionada pelo diretor da GPB compreende os Estados do Centro-Oeste, além de Pará, Rondônia e Tocantins. Juntos, concentram boa parte do rebanho nacional: das 234 mil cabeças de gado do país, 130 mil estão nessas áreas.
Oferta controlada
A disponibilidade controlada de gado nessas regiões é um dos fatores que explica a relativa firmeza das cotações do boi gordo neste início de mês, ainda que muitos frigoríficos no país tenham pisado no freio nas compras, já que o varejo também está demandando menos.
João Otávio Figueiredo, líder de pesquisa da Datagro Pecuária, afirma que, no curto prazo, a oferta de gado para os frigoríficos pode ficar um pouco mais escassa em locais específicos, mas em relação aos níveis elevados dos últimos meses. O tamanho do rebanho local garante certa estabilidade mesmo em momentos de ajustes como este.
Zillo acrescenta que os preços podem cair na segunda quinzena com alguns pecuaristas precisando vender animais para fazer caixa. Porém, recuos mais expressivos nos preços do boi gordo só devem ocorrer a partir do segundo trimestre do ano, quando começam a entrar no mercado os animais de confinamento.
Preços voláteis
Figueiredo lembra que a arroba do boi gordo registrou bastante volatilidade ao longo de 2023, saindo de R$ 290 em São Paulo no início do ano, para menos de R$ 200 em setembro. Desde então, recuperou parte da perda e vem oscilando entre R$ 240 e R$ 250.
“O ciclo pecuário surpreendeu e colocou bastante gado no mercado. Tivemos uma oferta 10% acima, rompendo novamente a casa de 30 milhões de cabeças abatidas no ano”, estima o analista da Datagro.
Segundo ele, o mercado interno voltou a ganhar força no último trimestre de 2023, em parte pela sazonalidade das festas de fim de ano, mas também porque a carne bovina ficou mais competitiva em relação ao suíno e ao frango, que se ajustaram às novas altas dos preços do milho. “Cheguei a ouvir de alguns frigoríficos que o mercado interno estava remunerando melhor que a exportação”, diz.
No curto prazo, ele vê o encurtamento das escalas de abate dos frigoríficos — número de dias à frente que a indústria já tem animais comprados — como algo negativo para a arroba do boi. No entanto, o preço do milho e os custos de reposição, que devem subir após um abate histórico de fêmeas, pode oferecer sustentação aos preços no restante do ano.
“Em condições normais de temperatura e pressão, o mercado do boi caminha para algo mais lateralizado este ano. Não devemos ver o boi passando de R$ 260, nem recuando além de R$ 230”, estima.
Segundo a Datagro, a arroba do boi gordo subiu quase 2% na sexta-feira (5/1) em Mato Grosso, cotada a R$ 230. Em São Paulo, os negócios ocorrem a R$ 246,02, um aumento diário de 0,13%.